O homem do talho pôs os cotovelos no balcão e pediu uma meia de leite. Desviei o olhar. Sempre embirrei com as meias de leite. Se eu fosse inglesa criava um top ten das minhas embirrações só por causa das meias de leite.
Preferi desviar o olhar. Concluídas as primeiras cinco páginas do livro que levava comigo, insisti. Apanhei o homem do talho com uma bola de berlim atravessada na boca no momento em que um bocadinho de creme se soltou e caíu ao chão. O homem do talho primeiro tentou apanhá-lo no ar, depois encostou o pé e empatou o jogo. Tudo isto enquanto mastigava a meia bola de berlim, e com a meia de leite na mão, agitando-a, como se algures no tempo um metrónomo concertasse todos aqueles movimentos. Bebeu uma pinguinha. Afastou os grãos de açucar da cara e fez um movimento com a língua no interior da boca. Estava nervoso. Olhou nervoso para a meia de leite.
Ainda tinha outra meia bola de berlim para comer e não tinha outra meia de leite para beber. Desviei o olhar. Nada podia fazer por ele. Ele continuou no seu dilema. Eu fingi que escrevia isto num guardanapo: tréguas, hoje é o último dia do ano.