30.4.09

horas

- Que horas são?
- Dez réis para o meio tostão.
Há quanto tempo não dou uma resposta destas?

28.4.09

acrobacia

ao escrever num mail 'encontramo-nos' perguntei-me de súbito pelo 's' final e isso remeteu-me a um estado de angústia do qual só saí ao sentir uma sede terrível (ultimamente os erros ortográficos não me largam, e o evidente transforma-se em erro e o erro em verdade e até coro de vergonha; e tudo isso me preocupa, porque acho que é o meu cérebro a envelhecer galopante); fui ao ciberdúvidas e sim, o 's' final cai - também era o que faltava -, e cai por 'haplologia', leio finalmente, e descanso por instantes, apenas: o assunto é bem mais complicado; no 'lavais-vos', por exemplo, volta o 's', e eu maldigo a língua que me calhou: ai haplologia, haplologia que não páras quieta, se eu fosse fadista faria um fado - o fado da haplologia -, olarela, que havia de rimar com sangria e arritmia e muita alegria.

26.4.09

papoilas a 200 à hora

Sexta-feira ao meio-dia, na viagem para Coimbra, as papoilas à beira da linha fizeram-me lembrar o Alentejo, Cesário Verde e morangos ao pequeno-almoço. Tentei enquadrá-las mas as papoilas não se deixam fotografar, ao contrário das nuvens, por exemplo. Percebo que o Alfa não pare nas estações intermédias mas deveria parar num campo cheio de papoilas. Pelo menos uma vez, teríamos feito uma viagem.

24.4.09

my web star

LinkMia, agora na casa africana.

23.4.09

inícios (24)

A nossa cantora chama-se Josefina. Quem não a ouviu não sabe o que é o poder da canção.

Franz Kafka
Josefina, a cantora ou O povo dos ratos
Trad.:José Maria Vieira Mendes

22.4.09

estações

Enquanto os meus olhos percorrem a pradaria,
sinto o verão na primavera.

América do Norte, Chippewas
Versão: Herberto Helder

21.4.09

música

A pequena Vitória entrou pela mão da mãe no café. A mãe levava a pequena Vitória pela mão e ia ofegante. A rua nem sequer é muito inclinada mas a mãe da pequena Vitória ia notoriamente ofegante e terá sido exactamente nisso que o dono do café reparou:
- Ó dona Vanda, a dona Vanda vem hoje muito ofegante.
A pequena Vitória, que parecia distraída, foi tão rápida que quem assistiu ainda hoje pensa se terá sido mesmo a pequena Vitória quem falou ou um anjo por ela, porque o que se ouviu em todo o café será sempre recordado:
- Ofegante Amadeus Mozart.
A pequena Vitória tem 5 anos e anda no infantário da Rosário.

20.4.09

túnel




DSCN0199.JPG, DSCN0200.JPG, DSCN0201.JPG

17.4.09

lugar ocupado

Detesto chegar ao café e ver a minha mesa ocupada. Não é para isso que uma pessoa se levanta todas as manhãs, penso ao sentar-me na mesa ao lado, a rosnar, como o Bo na sala oval, a verdadeira causa para o dono andar under stress. Ninguém o mandou escolher um portuguese water dog para firt dog, olha agora, faça como eu, não tenha cães e beba cafés. Depois de um café sinto-me com outro raciocínio, é normal, poderão pensar os incautos, e todas as pessoas que se julgam muito espertas logo de manhã, e tanto se me dá que pensem em voz baixa, como em voz baixa. Tenho a informar que o café aqui é uma grande porcaria. Valem-me os pacotes do açúcar, que não consumo, mas com os quais me farto de aprender. Aprendo uma infinidade de coisas, todas úteis, o género de coisas que a qualquer momento pode fazer falta e, para além disso, esmero a minha educação literária, que é a consequência de ler frases com uma determinada classe: "Foi no Inverno, meu amor, que nos amámos como nunca ninguém decerto amou." - Oficina do Livro, numa livraria perto de si, um novo romance, etc.

Há pessoas que se levantam tarde. Não é o meu caso. Mais valia que fosse. Essas pessoas gastam o tempo que lhes sobra a trabalhar, a conversar, a conduzir, a escrever, nos mini-mercados, no facebook, na ponte sobre o Tejo e também a beber café. Mas nunca, nunca a ler pacotes de açucar.

16.4.09

improvisação

forma, direcção, interacção, silêncio, não parar, dinâmica, oposição, fuga, eco, ponto, pulsação.

15.4.09

hialino

A palavra do dia no FLIP online é 'hialino', quer dizer transparente, como o vidro, de vidro. Estou cá a pensar como é que vou aplicar a palavra. Não sei, não sei, parece-me muito arriscado chegar ao pé de alguém e dizer. - É pá, que hialino que estás! Ou então: - Não te dou um abraço porque tenho medo que caias, estás muito hialino. Uma pessoa sujeita-se. Na melhor das hipóteses, ouve: - Olha lá, e se fosses chamar hialino a outro? Há palavras que não dão jeito nenhum para meter conversa.

14.4.09

'casa africana'

Ontem reactivei o 'casa africana', um blogue adormecido. Vamos ver.

13.4.09

a prática

- É de Viseu?! Não parece nada, sabe, tão pouco sibilante...
- Como?
- Faltam-lhe os chs...
- É que eu travo-os, sabe, quando eles estão para sair, travo-os. Parece complicado, mas não é, uma pessoa vai ganhando prática.

9.4.09

que é feito ?

que é feito do Puma Branca, pergunto-me, como quem pergunta por um velho colega de escola. estou sentada no café onde costumo encontrá-lo. uma empada, um copo de água, uma bica, expressamente curta, não devia comer empadas. estou a pensar nos velhos colegas de escola que permanecem como um mistério, os que não conhecemos muito bem e que, não obstante, nunca saíram da nossa memória. é curioso, sempre que me ocorre escrever 'não obstante', entusiasmo-me, mas sempre que a escrevo, arrependo-me. foi o caso e agora é tarde para voltar atrás e até para compreender porque é que a escrevo. nos domingos deste inverno, quando chegava do comboio, via o Puma Branco em frente à farmácia. a fumar, sempre a fumar. o cigarrinho é que nunca falha, concluo. já que penso nisso, acrescento que tenho pena que se tivesse deixado de escrever farmácia com ph.

7.4.09

ó lua que vais tão alta

Acabei de ver a lua. Desde sempre, quem vive vive a olhar para a lua. E, todavia, espanto-me, eu que tenho a lua inscrita nos genes. Vejo a lua há milhares de anos.

4.4.09

brinkmann

A IMAGEM

dela
a descalçar
as meias,
não sei,

diz ela, se ainda
se vende
carne de cavalo. A
imagem dela

a descalçar
as meias não dá
para descrever.

ROLF DIETER BRINKMANN
trad: Judite Berkemeier e João Barrento
"O Cinema em Palavras /Poemas-Piloto"
Fenda Edições

1.4.09

fazer serão

Se eu soubesse que tu ias
Esta noite ao serão,
Mandava varrer a rua
Cum raminho de hortelão.

Por Melgaço, o serão começa em uma terça-feira, nos fins de Setembro, e dura até sábado de Aleluia ou até terça-feira de Entrudo. Sentadas, em uma sala, palheiro, etc., as mulheres trabalham em costura, croché ou a fiar, formando círculo, à luz da candeia ou candeeiro, que pendem do tecto. O serão começa ao anoitecer e vai até à meia-noite ou depois. No meio dele, vêm os rapazes, que se sentam junto das namoradas ou dançam no meio da roda e tocam harmónico, guitarra...A luz é paga à vez pelas mulheres. As raparigas trazem flores para dar aos rapazes. Ouve-se em Melgaço:

Se eu soubesse que tu ias
Esta noite ao serão,
Mandava varrer a rua
Cum raminho de hortelão.

in
Etnografia Portuguesa,
Leite de Vasconcelos