31.8.11

agosto sob influência: claude monet




"Vamos, Monet, encare a realidade de uma vez para sempre. Imponha uma disciplina humana à sua inteligência. Convença-se de que há sonhos a que uma alma forte não pode aspirar porque são irrealizáveis. Não podemos ir além do mundo sensível, com os diabos!, e aquilo que você vê e sente é já um domínio suficientemente vasto e infinito."

Octave Mirbeau,  escritor, crítico, contemporâneo e admirador de Claude Monet, citado por Maurice Sérullaz (Enciclopédia do Impressionismo)

30.8.11

agosto sob influência: axel witsel

Um jogador de classe, este 28 do Benfica. Rendida.

29.8.11

agosto sob influência: marguerite duras

A escrita torna-nos selvagens. Regressamos a uma selvajaria de antes da vida. E reconhecêmo-la sempre, é a das florestas, tão velha como o tempo. A do medo de tudo, distinta e inseparável da própria vida. Ficamos obstinados. Não podemos escrever sem a força do corpo. É preciso sermos mais fortes que nós para abordar a escrita, é preciso ser-se mais forte do que aquilo que se escreve. É uma coisa estranha, sim. Não é apenas a escrita, o escrito, são os gritos dos animais da noite, os de todos, os vossos e os meus, os dos cães. É a vulgaridade massiva, desesperante, da sociedade. A dor, é Cristo também e Moisés e os faraós e todos os judeus e todas as crianças judias e é também o mais violento da felicidade. Sempre, acredito nisso.
Marguerite Duras, "Écrire"

28.8.11

arquivo (a menina e o cão)

IMG_3000.JPG © fatima ribeiro2009

26.8.11

marés

Estou aqui. A ver se acerto a respiração com as ondas que se desfazem na areia.

25.8.11

bravo!

No R & M em Santa Luzia, a aguardar o fim de um verão perplexo. O ciclista passa vagaroso na marginal ao fim da tarde. Olha à direita e à esquerda; pedala a 48 imagens por segundo. Leva uma mão no volante e na outra, apoiada na perna, uma cana de pesca. Vai mais vaidoso que Leonor pela verdura. Talvez o ciclista ainda oiça os vivas com que Tavira celebrou a vitória de Ricardo Mestre, nascido e da equipa de Tavira, na Volta 2011. É para isso que servem os herói populares, para nos fazerem ouvir foguetes na cabeça.

24.8.11

agosto sob influência: francis bacon

- Eu não desenho. Começo por fazer toda a espécie de manchas. Aguardo aquilo que se chama o "acidente": a mancha a partir da qual o quadro vai surgir. A mancha é o acidente. Mas se nos agarramos ao acidente, se cremos entender o acidente, estaremos ainda a fazer ilustração, pois a mancha assemelha-se sempre a qualquer coisa.
"Não se pode querer entender o acidente. Se pudéssemos compreendê-lo, compreenderíamos igualmente o modo como iríamos agir. Ora esse modo como vamos agir é o imprevisto, que é sempre incompreensível: it's basically the technical imagination, ou seja, "a imaginação técnica". Tenho procurado muito como chamar a este modo como vamos agir. Nunca consegui encontrar melhores termos que esses: imaginação técnica.
"Compreende, o motivo é sempre o mesmo. É a modificação operada pela imaginação técnica que pode fazer com que o motivo "se transforme" ao nível do sistema nervoso pessoal.
"Imagine cenas extraordinárias, isso não é absolutamente nada importante do ponto de vista da pintura, isso não é imaginação. A verdadeira imaginaçãoé construída pela imaginação técnica. O resto é a imaginação imaginária e que não conduz a lado nenhum.
"É por essa razão que eu não consigo ler Sade. Desagrada-me completamente, aborrece-me. O mesmo acontece com alguns escritores mundialmente conhecidos, cujas obras eu já não consigo ler. Limitam-se a escrever coisas que não passam de histórias sensacionais. Mas desconhecem a sensação técnica.
"É sempre com os meios técnicos que se encontram as verdadeiras saídas. A imaginação técnica é o instinto que trabalha fora do âmbito das leis para, em conjunto com a força da Natureza, transformar o motivo ao nível do sistema nervoso.
"Há alguns jovens pintores que apanham um bocado de terra e vão, em seguida, expô-lo numa galeria de pintura. Isso é um disparate e denuncia a falta de imaginação técnica. É interessante que sintam o desejo de mudar o motivo, ao ponto de virem a fazer isto: arrancar um bocado de terra e colocá-lo num expositor. Mas o que seria necessário é que a "força" com que extraem a terra se "modificasse". Que o tal pedaço de terra seja arrancado, sim, mas arrancado ao seu sistema pessoal e trabalhado com a sua imaginação técnica.

entrevista com Marguerite Duras, La Quinzaine Littéraire, 1981

23.8.11

agosto sob influência: thomas bernhard (bis)

PORQUÊ ESTA OBSCURIDADE?
Porquê esta obscuridade, sempre esta obscuridade total nos meus textos? A explicação é simples:
Nos meus textos tudo é artificial, quer dizer que todas as personagens, os factos, os incidentes se representam num palco, e o palco está totalmente mergulhado nas trevas. As personagens que aparecem no espaço quadrado da cena reconhecem-se melhor nos seus contornos do que sob uma iluminação normal, como é o caso na prosa ordinária. Na escuridão, tudo se torna claro. Não só as aparições, o que se obtém da imagem, não, também a linguagem. Há que imaginar páginas totalmente negras: a palavra fica mais clara. Daí a sua nitidez ou a sua nitidez redobrada. No começo, servi-me deste meio artificial. Quando se abre um dos meus livros, acontece o seguinte: é preciso imaginar que se está no teatro, ao virar da primeira página sobe um pano, aparece o título, escuridão completa, e desse fundo, dessa escuridão, surgem as palavras que se transformam em processos de natureza tanto interior como exterior, e que, em virtude desse mesmo carácter artificial, artificiais se tornam com redobrada nitidez.

Três Dias (auto-entrevista), 1971, monólogo de Thomas Bernhard num banco de jardim, arredores de Hamburgo, 1970, filmado por Ferry Rodax; em 1971 publicação no Der Italianer

22.8.11

levante


Tudo à minha volta é vento. A espuma, o sal, os canaviais e eu no centro. É lá que a minha consciência me põe, ao centro. Mas diante do vento e tudo o mais eu não sou o centro. Cinza insensata, talvez, o que resta de qualquer elemento. O vento é uma das maravilhas do momento.

18.8.11

agosto sob influência: thomas bernhard


O FRIO AUMENTA COM A CLARIDADE (1965)
"Respeitável público:
Não consigo achar graça ao vosso conto dos Músicos de Bremen, não quero contar nada, não quero cantar, não quero prégar, mas uma coisa é certa: já não é tempo de contos, sejam sobre cidades, sobre Estados, sejam científicos ou até mesmo filosóficos. Acabou-se o mundo dos espíritos. O próprio universo deixou de ser um conto. A Europa, a mais bela, está morta; eis a verdade e a realidade. A realidade, tal como a verdade, não é um conto, e a verdade nunca foi um conto. Há cinquenta anos a Europa ainda era um verdadeiro conto de fadas. Nos dias de hoje, muitos ainda vivem nesse mundo de conto de fadas, mas esses vivem num mundo morto, e aliás trata-se de mortos. Aquele que não está morto vive, e não nos contos; esse não é um conto.
(...) Viver sem contos de fadas é mais difícil, por isso é tão difícil viver no século XX. (…) Estamos no território mais espantoso de toda a História. Estamos aterrados, e aterrados enquanto material monstruoso do homem novo e do conhecimento novo da natureza, da renovação da natureza. Durante este meio século, todos nós não fomos mais do que uma grande dor; esta dor constitui-nos; esta dor é agora o nosso estado de espírito. (...)
(...) Agora colocamos muito alto as nossas exigências, que nunca nos parecem suficientemente elevadas. Nenhuma época colocou tão alto as suas exigências como a nossa; existimos já na loucura das grandezas; mas como sabemos que não podemos cair nem morrer de frio, não temos dúvidas em fazer o que fazemos. (...)
(...) Conhecemos agora as leis da natureza, as Altas Leis infinitas da Natureza, e podemos estudá-las na realidade e de verdade. Já não estamos reduzidos a hipóteses. Quando olhamos a natureza já não vemos fantasmas. (...) Tudo será claro, de uma claridade cada vez mais alta e sempre mais profunda, e tudo será frio, de um frio cada vez mais espantoso. A impressão de um dia sempre claro e sempre frio é o que nos reserva o futuro.
Agradeço a vossa atenção."

do discurso pronunciado em Bremen na entrega de um prémio literário; Thomas Bernhard, escritor de língua alemã; austríaco, nasce na Holanda em 1931, morreu em 1989; legou-nos uma obra extensa e dura, da qual só conheço bocadinhos. 

17.8.11

agosto sob influência: manuel bandeira

PORQUINHO-DA-ÍNDIA
Quando eu tinha seis anos
Ganhei um porquinho-da-índia.
Que dor de coração me dava
Porque o bichinho só queria estar debaixo do fogão!
Levava ele prá sala
Pra os lugares mais bonitos mais limpinhos
Ele não gostava:
Queria era estar debaixo do fogão.
Não fazia caso nenhum das minhas ternurinhas...

- O meu porquinho-da-índia foi minha primeira namorada.

TERESA
A primeira vez que vi Teresa
Achei que ela tinha pernas estúpidas
Achei também que a cara parecia uma perna

Quando vi Teresa de novo
Achei que os olhos eram muito mais velhos que o resto do corpo
(Os olhos nasceram e ficaram dez anos esperando que o resto do corpo nascesse)

Da terceira vez não vi mais nada
Os céus se misturaram com a terra
E o espírito de Deus voltou a se mover sobre a face das águas.


MADRIGAL TÃO ENGRAÇADINHO
Teresa, você é a coisa mais bonita que eu vi até hoje 
na minha vida, inclusive o porquinho-da-índia que
me deram quando eu tinha seis anos.

Manuel Bandeira, "LIBERTINAGEM", publicado em 1930; trinta e oito poemas escritos entre 1924 e 1930, entre eles, "Poética", "Evocação do Recife", "Nocturno da Rua da Lapa", "Poema de Finados"; andei a lê-los, estes e outros, em dois livros publicados em Portugal: "OBRAS POÉTICAS", Minerva, 1956, e "POESIAS", Portugália, este último com selecção e prefácio de Adolfo Casais Monteiro - pelo que percebi, um importante prefácio sobre o poeta e o modernismo brasileiro. "Não quero saber mais do lirismo que não é libertação".


16.8.11

agosto sob influência: joão penalva


exposição na gulbenkian - cam; em cena  até outubro; trabalhos com texto e imagem; narrativa próxima de um filme, como diz a comissária da exposição? creio que não; então o quê? 

um exposição. sim às vezes narrativa, eventualmente, às vezes cinema; pessoalmente o que fixei foi isto: o artista transforma o 'como' na sua arte , o 'como' é a 'obra', a obra não é a vida (esta será, talvez, o 'como' se viveu a obra).

retive em particular : (não apontei os nomes, mea culpa)* aquela 'ala central' onde uma pessoa se passeia como na rua, parando, olhando, lendo, vendo; *os trabalhos do "cabelo"; * da "traça";* as cadeiras-video. aos domingos é gratuita.

15.8.11

agosto sob influência: jacques tati

revejo no nimas 4 das 6 longas de jacques tati. admiro o génio do homem. e admiro-me das influências que tati teve em mim, aprendiz sem jeito. não tinha consciência do quanto e a que ponto, tanto mais que não vejo estes filmes há 20, 30 anos. hoje passa o último do ciclo: play time. mais surpresas, portanto.

13.8.11

BRISA

Vamos viver no Nordeste, Anarina.
Deixarei aqui meus amigos, meus livros, minhas riquezas, minha vergonha.
Deixarás aqui tua filha, tua avó, teu marido, teu amante.
Aqui faz muito calor.
No Nordeste faz muito calor também.
Mas lá tem brisa:
Vamos viver de brisa, Anarina.

Manuel Bandeira, "Belo Belo"

12.8.11

marítima




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11.8.11

W.J.Cliffe, morto aos vinte anos

No último sábado de Julho, a caminho de Montparnasse, entrei numa livraria. Precisava, por causa dum trabalho, do "Moderato Cantabile". Comprei-o. Olhei à despedida para a estante da Gallimard e, no meio de outros livros da Duras, havia um que parecia olhar para mim. Tenho-o aqui ao meu lado, enquanto escrevo este post. Chama-se "Écrire"; tem 5 textos e uma dedicatória: "Je dédie ce livre à la memoire de W.J.Cliffe, mort à vingt ans, à Vauville, en mai 1944, à une heure restée indéterminée."

"La Mort du Jeune Aviateur Anglais" é um relato emocionante. Emocionou-me. E ler Duras na sua língua é, por si só, emocionante. Já tinha tido essa experiência com García Márquez quando estive vários meses seguidos em Madrid sem falar português. Só aos sábados, numa cabine telefonica, falava com o meu pai (outras vezes tentava cantar enquanto descia a Calle Princesa, onde havia o Corte Inglés mais perto de mim, mas, não sabendo de cor letra de canção nenhuma, desistia). O primeiro livro que li em castelhano duma ponta à outra foi "Crónica De Uma Morte Anunciada". E foi uma música que nunca mais me saíu da cabeça. Mas García Márquez é o autor "Cem Anos de Solidão". Explico-me:  "Cem Anos de Solidão" bateu-me de tal maneira que, com receio de perdê-lo, nunca mais o li. Nem no original. Não é fácil uma pessoa desfazer-se dos quinze anos.

Com Duras o combate sempre foi outro: uma distância, uma reserva, uma tensão nos ombros. E senti-me, ao ler "La Mort du Jeune Aviateur Anglais", em movimento, a dizer adeus a isso tudo, um tudo que era nada e que durou anos. Foi essa a minha primeira emoção ao ler esse livro, dedicado a W.J.Cliffe, morto aos vinte.

10.8.11

PROBABILIDADE

Não sei se estás no campo ou na cidade, e também não sei se vais à praia ao fim da tarde. Nem sei se é grande ou pequena a probabilidade de passares sob a sombra duma figueira. Mas se isso acontecer, lembra-te de mim e pára.

9.8.11

o regresso de Castafiori

Castafiori viajou. Castafiori gosta de viajar. Fomos jantar um dia destes e, depois, enquanto descíamos em direcção ao rio, ouvi-a dizer, Está uma noite estupenda. Há que tempos que eu não ouvia dizer, Está uma noite estupenda. Vivo num meio onde os substantivos ocupam com facilidade o lugar dos adjectivos. Assim não é com Castafiori. Se uma noite está estupenda, está estupenda. Só depois me falou da viagem, dos campos de túlipas, dos pintores que eternizaram a luz do continente, e pude verificar quanto permanece em nós o fascínio por esse "lá fora" que ainda não afastámos do pensamento, nós, europeus do norte de áfrica. Castafiori gosta de viajar. Lamenta nunca ter ido a Itália, nunca ter ido a Chipre, nunca ter ido para lá de Berlim. Depois disso, só a China lhe interessa. Mas a China agrícola, precisou, Sabe, lá para o pé dos búfalos e do arroz integral. Ficámos em silêncio. Castafiori quiça meditando no oriental desejo, eu toda especulação: a China agrícola. Estávamos a chegar ao Arco da Rua Augusta, quando ouvi a voz de Castafiori mergulhar na escuridão da Praça do Comércio, Tinha era que levar um bom mosquiteiro.

8.8.11

eclipse

os sonhos cansam

5.8.11

estação de campanhã





 


 


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4.8.11

civilização

os gatos franceses brincam com rolhas de garrafas de champanhe