15.12.07

piercing

“1971” era o que estava inscrito no capuz do blusão. Era uma inscrição em fibra, alto revelo, cinzenta sobre azul escuro. O cabelo, talvez melhor dito, o penteado, é mais difícil de descrever, embora, embora a cabeça tivesse quase toda rapada, quase, porque em cima tinha uma espécie de crista, uma crista seguida de um carrapito. Tudo isto sob uma cor crioula. Ela não. Mais velha, deslavada, um piercing no lábio, outro piercing no nariz, mais um na orelha direita. Estavam na mesa em frente, mas de costas para mim.
O 1971 disse-lhe a um dado momento, depois de ter deitado um olho à janela - “olha o teu irmão”, mas ela não reagiu logo. Deve ter sido por isso que o 1971 insistiu - “queres que o chame?”. Ela, ponderada apesar do tremor da perna direita, e eu reparei nisso porque era do mesmo lado da orelha do piercing, ela levou a garrafa de pedras salgadas à boca e depois é que disse - “chama aí”. O 1971 saíu. Saíu e voltou, voltou com o irmão dela. Eu nem precisava de ter ouvido o 1971 dizer "olha o teu irmão". Via-se logo que eram irmãos, pelo piercing no nariz via-se logo.