16.9.08

férias grandes (1) o lombinho de porco preto

Já passava da uma da tarde. À porta da sede sportinguista de Viana do Alentejo estavam dois rapazes com as respectivas minis na mão. Um deles cantava. O outro respondeu à pergunta: "No fim da rua, à direita, está a ver aquele sinal?, passa duas ruas, não é a primeira nem a segunda, é a outra, sobe um bocadinho a rua, fica do lado esquerdo, mas em olhando logo vê".

Ainda não esqueci o lombinho de porco do restaurante que em olhando logo se via, esplanada improvisada à porta da rua, no metro e meio de sombra entre a parede e o alcatrão. Dali seguimos - eu, o cliozinho e uma amiga minha - rumo ao sul, rumo a Tavira, Santa Luzia exactamente. Tinha-me decidido pelo interior, numa espécie de ensaio da viagem transfronteiriça que quero fazer e para a qual nunca encontro companhia. Em Agosto? O teu carro tem ar condicionado? Tem, mas não funciona. Então não tem. Tem. Não tem. Tem, mas acabou-se o gás. O gás?! Não fazia ideia que o teu carro era a gás. Não, o ar condicionado é que... É pá, não te ponhas a explicar como é que funciona o ar condicionado, quero lá saber como é que funciona o ar condicionado, funciona e pronto, quer dizer, no teu caso não funciona. Olha lá, e não podias fazer essa tal viagem na Páscoa? Não me gozes, a viagem transfronteiriça é para ser feita no Verão, qual Páscoa, qual caraças, no Verão. Senão não se apanha o espírito da coisa. O espírito da coisa? Com o calor que está em Agosto deve ser cá um espírito... Deves ter muito a ver com isso!

Adiante. Ainda com o sabor da esplanada, e a frustração de mais um Verão não-transfronteiriço, passei por Alvito, passei por Cuba, passei ao largo de Beja, sempre à esturrina do sol, como diria a minha mãe, até apanhar a estrada para Mértola. Estávamos a 23 de Agosto, um sábado em que não corria uma aragem. A rodagem de "O Meu pai" tinha acabado dois dias antes, quinta, 21. A 22 entreguei o resto da papelada. A 23 atravessei finalmente o Tejo. Tinha-o feito há poucas horas e já começava a recordá-lo. A memória é um vício.

Nacional 4. Em Montemor cortei para Alcáçovas, onde já não ia há séculos. Entramos num café, um café de azulejos tristes, um vago cheiro a mofo, dois queques abandonados sob o vidro riscado do balcão, onde o Record de há 4 dias era a novidade mais sonante. Tem sandes? ainda me atrevi a perguntar. De queijo e fiambre. Mas sentia-me derrotada pelo ambiente, não fui capaz de dizer que farta de queijo e fiambre andava eu. Lancei então uma armadilha: "e de presunto, tem"? Não, de presunto não tinha. "Deixe lá, também não tenho muita fome". Ala que se faz tarde. Num ápice estava na rua, virei a esquina e entrei nos balneários públicos. Molhei os braços até aos cotovelos mas um rasto de má fortuna seguira-me. À posteriori, pensei que só podia ser essa a explicação. E francamente, acho que pensei bem.

Ao entrar no carro, dei voltas e mais voltas à procura dos óculos comprados em Maio, raios partam os óculos, 700 euros ainda é dinheiro, levei dois anos para mudar de óculos, raios partam a graduação progressiva. Começava a pensar que tinha sido muito má ideia passar por Alcáçovas depois de vários séculos sem lá ir. Afinal os óculos estavam caídos no interior do cliozinho e o cliozinho nada, calado, muito bem caladinho, como se não fosse nada com ele. Por esta vez vá, não ligo, the show must go on. Vinte quilómetros depois sim, ouvi uma boa notícia: " está a ver aquele sinal?, sobe um bocadinho a rua, fica do lado esquerdo, mas em olhando logo vê".