21.10.10

a aposta

Dois e dois são cinco? Não. Dois e dois são quase cinco. Continua a estar longe de ser exacto. Mas não deixa de ser uma afirmação com futuro, penso eu, pelo menos, com algum futuro. Quem sabe se, um dia, dois mais dois não serão cinco, e ainda que seja uma afirmação arriscada, há nela uma expectativa, não direi própria de uma utopia, mas, vá lá, própria de uma certa abertura de espírito. Em contrapartida, há afirmações que, sendo exactas, escapam a qualquer futuro, como esta: às cinco e  cinco, o príncipe morreu; o príncipe morreu sem chegar a rei e a princesa ficou viúva à hora do chá sem chegar a rainha. É uma afirmação exacta, desesperadamente exacta. Poor girl, comentaram, há amores perfeitos e capelas imperfeitas. É uma afirmação inadequada e, numa certa óptica, de mau gosto. A batata pode ser doce mas a lógica também pode ser uma batata. Se não fosse assim, diríamos, Olha ali está uma laranja amarga, mesmo antes de a provar, e renegaríamos para sempre o princípio in dubio pro reo que, não sendo um princípio citrino, lhe poderá ser aplicável, cum grano salis. É claro que há pessoas que dizem, Olha ali está uma laranja amarga, mesmo antes de a provar. Geralmente esta afirmação é acompanhada por uma aposta. E cá voltamos ao que interessa: há quem aposte que dois e dois são cinco, mas não há quem aposte que dois e dois são quatro. Daí que considere provada a afirmação supra: dois e dois são quase cinco - está longe de ser exacto, mas não deixa de ser uma afirmação com algum futuro.