Estava eu a ver o dvd de "Slinding Doors", com Gwyneth Paltrow, quando Castafiori chegou a minha casa. Tínhamos combinado ir ao King ver um filme francês. Castafiori gosta do cinema francês. Não sou eu que a vou criticar. Eu também gosto. Mas Castafiori tem outros gostos para além do cinema francês.
Vou dar um exemplo: chega sempre, pelo menos, meia hora antes. Irrita. Irrita um bocado. Pelo menos a mim irrita-me. Não tanto como se chegasse meia hora atrasada, mas irrita ficcionar-se assim um atraso que não existe, uma transferência. Uma pessoa sente-se culpada, sente que está atrasada, o que não está certo, porque simplesmente eu não estava atrasada. E para mais, num domingo quente como o domingo passado, o que é que se vai fazer meia hora antes para o King? Mas eu só queria acabar de fazer o que estava a fazer. Foi isso que lhe disse. Talvez um pouco secamente.
Castafiori sentou-se um bocadinho contrariada. Puxou de um leque. Puxou do telemóvel. Puxou dum jornal. Os domingos em Lisboa são puxados. Mas os gestos e fragmentos vão-se extinguindo. Começo a sentir o peso duma certa quietude. Pelo canto do olho, pude constatar que Castafiori estava a ver o filme, com a Gwyneth Paltrow. Eu também estava a ver o filme, com a Gwyneth Paltrow. OK. Não deixava de ser intrigante, os segundos passavam e Castafiori sem dizer palavra. Tudo tem uma explicação e ela chegou:
- Não me importava nada de ter uma carinha assim.
Eu olhei para ela. Mas ela não me estava a ver. Continuou:
- Uma sarda aqui, uma sarda ali.
Gostei do detalhe. Voltei ao filme. Já agora acabava de ver o filme antes de me enfiar numa sala escura a ver um filme francês num domingo de Agosto. Porém, tive dificuldade em concentra-me. Castafiori reincidiu:
- O que me vale é que com a idade fui melhorando.