Almoçei tardiamente com Castafiori. Um domingo de sol convida a atrasos e bifes de perú com mostarda. Tenho andado arredada do mundo. Felizmente, nas nossas vidas, há sempre quem repare essas falhas. Informam-nos sobre a nação árabe, informam-nos sobre as manifestações previstas, informam-nos sobre os pibs, informam-nos sobre a queda da deutsche telekom. Raramente se ficam por aí. A ignorância enfraquece-nos. Retira-nos poder e, até, capacidade de reacção. E ei-los a perorar sobre palo alto, maquinistas da cp, a margem de progressão de nico gaitán, para não falar no amor, que é onde, de uma maneira ou outra, todos os almoços de domingo acabam. Assim foi com Castafiori.
Depois de me informar sobre o estado da nação árabe, as manifestações previstas, os pibs deste e do outro mundo e, também, sobre a queda da deutsche telekom, desatou a falar sobre a violência doméstica. Segundo Castafiori a violência doméstica tem a sua causa no alcoolismo. Eu tenho grandes dificuldades em ouvir teorias gerais (admito, no entanto, que tenho grande facilidade em produzir teorias gerais). Por isso, quando ouço teorias gerais, por delicadeza entretenho-me a observar os pormenores da cena. E foi assim que verifiquei o seguinte: Castafiori perorava sobre violência doméstica com um cálice de vinho do porto na mão direita. Como era domingo, e era almoço, e estava sol, optei por um humor sem consequências e disse:
- Se este almoço fosse ter ao youtube, não sei como é que você se ia safar, um discurso sobre violência doméstica acompanhado a vinho do porto.
Castafiori respondeu-me pausadamente, apenas traída quando, ao pegar no guadanapo, se ouviram as pulseiras no pulso esquerdo:
- E quem é que se preocupa com o youtube quando tem na mão um tawny envelhecido? O importante é a imagem. Aprenda que eu não vivo sempre.
E eu aprendi. Ao jantar, bebi um cálice de porto branco, para comemorar a vitória do Benfica no último segundo. É assim a chama imensa.