"Estimado Cliente, informamos que devido à realização de trabalhos na rede de distribuição, o fornecimento de água será interrompido temporariamente entre as 14 e as 18 horas. Apesar dos esforços desenvolvidos para concluir os trabalhos no período previsto, este pode ser reduzido ou prolongado sem novo aviso." Eram 17h e 40. Ao ler o aviso na porta do prédio, uma sede imensa assaltou-o, ali, à porta do prédio, ao ler o aviso: e se os trabalhos se atrasassem, apesar dos esforços? Está sempre a acontecer, atrasarem-se os trabalhos está sempre a acontecer, é da natureza do trabalho exactamente isso: estar sempre a acontecer e atrasar-se.
Entrou no café da esquina e pediu uma imperial. Mas não havia. Pediu uma mini. Mas não havia. Pediu heineken, não havia, pediu carlsberg, não, não havia. Desesperado, pediu uma superbock de lata. Não havia. Só de garrafa. Ou então de 50 cl. Mas há cristal. Não. E sagres ? Sagres, sim, de 50 cl, sim, senhor, havia. Sabe, estamos à espera da distribuição. Há dias assim. Toda a gente chega aqui e pede uma imperial, e depois acaba a imperial, pedem minis, e depois acabam as minis, pedem médias, sagres, superbock, acaba a sagres, acaba a superbock e assim sucessivamente. E um copo de água? Um copo de água como? Pode-me dar um copo de água? Água? A água está cortada, a epal andou aí a distribuir avisos em todos os prédios, não viu o aviso? Mas tenho aqui água do luso, luso e formas luso: fambroesa, chá verde, limão. E fastio, tem? Fastio, não tenho, tenho vitalis, tenho pedras, tenho serra da estrela. E tenho luso. E formas luso: fambroesa, chá verde, limão. Que horas são? 18h02. Já há água? Na torneira? Não. Era o que eu pensava. É da natureza do trabalho. Está sempre a acontecer. Dê-me uma sagres de 50 cl. Uma sagres de 50cl? O que é que quer que eu lhe faça? Daqui a nada nem isso tem. Olhe, já há água, não quer o copo de água? Agora já pedi a sagres.